domingo, 21 de junho de 2009

A Lenda do abominável Pé-de-bombo


Texto de Jotacê Cardoso

Naquela manhã, cheia de sol, pelas ladeiras de Olinda, as velhinhas Param. De repente saem correndo e gritando. O velho Pé-de-Bombo surge lá no topo e dá um urro. Com um de seus pés deformado, enorme já que o outro era do tamanho natural, vem andando irregular...mancando que só a peste!...desce a ladeira da misericórdia.....as velhas gritando...segurando seus vestidos pelas barras....e ele urra...graurrrrrrrr...sua barriga enorme o impele para completar rapidamente aquela descida da íngreme ladeira. A cada pisada com aquele enorme pé ouvia-se a batida de uma alfaia mais forte que aquelas do maracatu da noite dos tambores silenciosos. Aliás, segundo dizem os mais velhos a noite dos tambores silenciosos surgiu devido ao caminhar noturno da grotesca criatura....se ouvia por todo canto o: Bum!.......Tum.........Bum.......Tum!.........era o velho pé-de-bombo que saia aterrorizando a população noturna.
Certo dia, um dos mais velhos daquela cidade me contou: O Pé-de-bombo saiu com uma vontade de mijar e desceu um pouco mais, longe daquele lugar onde habitava, uma caverna atrás da igreja da Sé. Desceu um tanto a mais e caminhou segurando aquela mijada forte. Chegando a parte baixa rancou seu fazedor de xixi e pregou fogo naquelas matas baixas. Foi tão grande sua mijada, mas tão grande que o líquido fervilhava por entre a grama e formava um pequeno caminho que ia abrindo ao longe, ia enchendo de uma tal forma que ao sorriso dele, olhando no horizonte, viu formar um rio. O rio enorme passou a dividir Olinda e Recife e passou-se chamar “Beberibe” que significa “A terrível mijada do abominável Pé-de-bombo”. Até hoje ainda quando enche podemos sentir a catinga do mijo da criatura. Aquilo féde que só a porra quando enche.
Uma parte da população corria de medo para um local onde se aglomeravam, iam para a ilha de Santo Antônio. De tanto isso acontecer foram construindo um enorme galpão para abrigar a turba. Todos com medo do abominável pé-de-bombo. E isso foi se tornando tão constante que a população resolveu construir um enorme galpão onde precisavam ficar abrigados e escondidos. Rezavam para S. José, era o Santo preferido e por isso esse galpão enorme passou-se chamar: “Mercado de São José” que existe até hoje. A criatura não morre, ela existe desde os áureos tempos, dizem que a ponte de Nassau foi construída para que ele e os Holandeses tivessem como correr da criatura.
E através dos séculos ele continuou aterrorisando. Dizem alguns exagerados que ele tinha um bafo terrível os olhos meio que carregados de pequenos vasos sanguíneos vermelhos e a sombra celha enorme de grossa, os cabelos saiam pelas narinas e orelhas. Os cabelos ficavam duros (De tanto sebo) que dava para quebrar pedras, fornecendo-lhe um capacete natural. Saia fogo das ventas e seus dentes caninos avantajados completavam o terrível aspecto que se moldava ao condensar das remelas e melécas que saiam do nariz.
Uma estória que não podemos esquecer é a da filha de pé-de-bombo. Ela foi capturada por um esperto caipira vindo da região dos caipiras, lá do Oeste do estado de São Paulo.
Zé Gordo (Também conhecido como Zé Viola), era terrível, fez uma armadilha usando recursos tecnológicos e engabelou sua vítima. O pé-de-bombo ainda com ferramentas e utensílios rústicos relutava em acostumar com a modernidade. Suas ferramentas de pedra lascada eram rudimentares. A filha dele caiu na armadilha, foi capturada e dizem as boas línguas que vivem felizes para sempre lá pelas beiras do Paraná e Paranapanema. Pé-de-bombo com o passar do tempo aceitou o seqüestro como uma coisa normal e se deu bem com o (agora) genro – Zé Viola. Tinham em comum uma enorme barriga, comiam para karalho, o que fazia com que se unissem.
Pé-de-bombo ao correr, deu origem ao FREVO. A batida do surdo é o caminhar rápido dele. As pessoas não aceitam muito, mas ele foi o grande incentivador e criador das artes que marcou seu estado – Pernambuco. O Maracatu, a noite dos tambores silenciosos, o frevo e também a ciranda que foi originada quando ele ficava dando voltas formando um círculo gritando de dor por causa de seu pé enorme. Lia de Itamaracá ao ver a cena resolveu aderir e também formou mais um fenômeno turístico cultural para Pernambuco.
A Domadora Nanci das cavernas as vezes o deixava tranqüilo. Porem era breve. Ela o colocava na linha e em ordem, fazendo respeitar as regras da casa. O mais importante é que Nanci das cavernas e Velho Pé-de-bombo continuam juntos e felizes para sempre.
Certa vez, pé-de-bombo descia uma das ladeiras tranquilamente, seu caminhar era de uma marcha rancho, um frevo canção...um moleque filho da puta pega seu bodoque e atira bem em cima do pé grande de pé-de-bombo. Ele começa pular. Porem ao lado vinham várias pessoas que pensando estar dançando começaram a cair no passo. E pularam juntos, formando um maravilhoso bloco. Até hoje, tem o Bloco do pé-de-bombo que carrega junto a seu estandarte um boneco gigante com um dos pés bem grandes como se estivesse engessado. Mas ele pulou de dor. O moleque mardito acertou bem em cima da testa do pé dele. Era uma dor da mulésta! E o povo pulando ao lado ia cantando...ele, não sabia se chorava ou se cantava junto...e conforme doía acompanhava com seu passo a batida do surdo do frevo.

A Branca de neve, no cantinho, em uma esquina, olhando tudo, quietinha, com suas borboletas coloridas, como bandeiras de São João..., assistia o velho pular o frevo....
a população fervilhava, e uma grande festa surgiu naturalmente como acontece em Olinda e Recife.
E eles cantavam...
"O frevo do pé de bombo...redondo....
vai pulando até lascar......
o velho soltava gritos de alegria
para o povo então cantar....
ai ai ai ai meu pé, mas que chulé
dançando de alegria
ai ai ai ai meu pé aí que chule
esse povo é o que é ........

E assim, para quem sentou e pegou a estória, que entenda.

Como velho e abominável - pé-de-bombo é eterno, ele continua feliz da vida, orgulhoso pelas coisas que faz, sem se importar com os gritos das senhoras idosas que ao vê-lo saem correndo. Continua comendo feito um elefante e agora passou a exercer o ofício de escritor. E é aí que acho que acabo de me lascar........

Jotacê Cardoso
Junho de 2009

Um comentário: