quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

PAGINAS DA VIDA “V” – O TINTUREIRO


Depois de quase três anos, voltei a encontrar eu amigo Jonas “O Pescador”. Foi um momento de rara alegria, o Jonas se emocionou, deu-me um forte abraço, daqueles que só recebemos dos melhores amigos; abraço com um “Q” a mais, aquele alisado nas costas a altura dos ombros, é aí que vemos e sentimos o carinho das pessoas que de fato sentem-se felizes por nos encontrar.
Conversamos bastante durante horas, relembramos nossos encontros na praia, sentados à sombra de um coqueiro, degustando nossa cervejinha; ele contando suas aventuras de velho pescador e eu simplesmente ouvindo e anotando tudo. “Velhos tempos”!
Falou-me que tinha visto o escrito de suas aventuras e que havia gostado bastante, sem antes fazer elogios à forma da narração, inclusive nos detalhes do acontecido e que voltava a afirmar que tudo que ele falou e que eu transcrevi era a pura verdade. Sem tirar nem por uma única vírgula.
Em certo momento perguntei se continuava pescando, e se havia algo de novo que ele pudesse relatar? Ele me olhou de forma que me deixou alerta, sabia que dentro em breve, teria eu um novo causo para editar em nosso blog; e assim ele iniciou sua narrativa.
Amigo; arrumei um novo parceiro para minhas pescarias, acho que você deve conhecer; o “Nelson”, aquele da cicatriz na barriga! (Fiquei pensativo tentando me lembrar da pessoa citada), de repente o velho pescador alertou: ali vem ele! Olhei na direção que ele apontava e reconheci de imediato; era outro pescador que me havia sido apresentado pelo Jonas, cumprimentamo-nos; ele sentou ao nosso lado, então o velho amigo começou sua narração.
Estávamos, eu e o Nelson de viagem para uma pescaria em um local bem distante da costa, já velejávamos há quase três horas. De repente o Nelson chama minha atenção afirmando que alguns pregos estavam soltando-se das tabuas de sustentação do barco, fomos à caixa de ferramentas e não encontramos o martelo (havíamos deixado em terra, mas para que martelo em pescaria?), estávamos de fato em grandes apuros. Alguns segundos de medo, (quase pânico).
De repente vimos um cardume de tintureiros, “tintureiros”? (Repeti abismado), sim, disse Nelson: tintureiros é um peixe que vocês conhecem como “tubarão martelo”, (e o Jonas continuou sem me dar ouvidos), então esperei a passagem de um tintureiro menor, apanhei-o pelo rabo, tirei-o fora d’água, e imediatamente bati os pregos que estavam saindo da taboa, assim continuamos nossa viagem em segurança.
Olhei espantado para o Nelson, (que me olhava por cima dos óculos), ele balançou a cabeça em um gesto de afirmação daquilo que estava sendo narrado pelo velho pescador.
Os dois levantaram-se, fizeram gestos de cumprimento e saíram do local sem pronunciarem uma única palavra e nem olharam para traz.
Fiquei durante alguns minutos sem ação, mas emiti um sorriso, balancei a cabeça em um gesto de negação e sai do local para escrever mais uma das muitas PÁGINAS DA VIDA.

DOMINGO LINDO


Passaram o mês inteirinho
Vendendo todos os ingressos
Todos muitos coloridos
E de fato bem impressos
O líder comunitário
Não queria retrocesso
Pra o primeiro piquenique
Qualquer um teria acesso.

Contanto que você pague
O valor de uma só vez
Não pode ser dividido
Pra evitar liquidez
É um valor tão pequeno
Garanto isso a vocês
O dia já esta marcado
Vai ser nesse fim de mês

Fizeram foi propaganda
Até em carro de som
Procurem o seu Batista
E comprem o seu cupom
O transporte ta garantido
Em um ônibus muito bom
Com cadeiras reclináveis
Feitas de couro marrom.

Com uma semana antes
Já tava tudo vendido
A Amara comprou quatro
Ela, dois filhos e o marido
E informou as amigas
Que já tinha resolvido
Na praia; fio dental
Pra nada ficar escondido

E teu marido mulher?
- Ele é muito liberal
Vai de short asa delta
Só pra esconder o bilau
Quando olharem pra ele
Não vão querer passar mal
Ele é meio avantajado
É assim o Juvenal.

Os jovens já prepararam
Dois times de futebol
Colocaram logo os nomes
Espinhela e caracol
Iriam jogar no campinho
Que tem em frente ao farol
Depois do jogo teremos
Três isopores com Skol

No dia e hora marcada
O ônibus já estava lá
O líder comunitário
Andava de lá pra cá
Ta faltando muita gente
A saída vai atrasar
Temos hora pra sair
E hora para chegar

Mais dez minutos depois
O ônibus deu a partida
Quem provocou o atraso
Foi à turma da batida
Os batuqueiros do samba
Que iam animando a ida
E na volta quem anima?
Só quem não tomou bebida.

Vamos ver o que levaram
Pra praia os farofeiros.
Pra beber levaram rum,
Vinho, cachaça de cheiro
Vodka, cerveja e conhaque
Pra beberem o dia inteiro
Um fogareiro e carvão
E alguém pra churrasqueiro.

Pra comer levaram pão
Galeto, e carne assada
Pras crianças só levaram
Muita pipoca e cocada
Levaram muita farofa
Daquela embolorada
Com cebola e muito coentro
E tapioca ensopada.

Na viagem era um barulho
Daquele bem infernal
Cada um cantava um ritmo
Era uma loucura total
O batuque era estranho
A música? Era surreal
Quando batiam no surdo
Parecia um berimbau

Cantavam-se musica antiga
A letra ninguém sabia
Aí misturavam tudo
No fim ninguém entendia
Se cantavam ou berravam
Se chorava ou se sorria
E o motorista gritava
Parem com essa anarquia!

No caminho a policia
Parou para revisar
A lotação do veiculo
Pois era particular
Então deram uma batida
Tava tudo em seu lugar
Disseram tá tudo OK
Começaram a lhes vaiar.

Quando chegaram à praia
Foi aquele fuzuê
O refrão naquela hora
“Só vai ter bunda lê, lê”
Vamos todos, pessoal!
Ta na hora de descer
Aquele que demorar
Não vai comer nem beber

O Juquinha foi correndo
Na areia se enroscou
Parecia um empanado
Fedendo muito a cocô
Rolou em cima da bosta
Porque nem ele notou
Que alguém tinha ali cagado
Na noite anterior.

E Justina a noiva dele
Disse contigo não fico
Não vou ficar com um cara
Rodeado de mosquito
E o que é que vão pensar
Esse rostinho bonito
Abraçada ao fedorento
Vai ficar muito esquisito.
Os times estavam prontos
Pra o jogo de futebol
Que tinha sido acertado
Pra o campinho do farol
Foi trocado na chegada
Por jogo de voleibol
Outros ficaram empinando
Pipas com linha e seról

De repente vão chegando
Ônibus por todos os lados
Gente por todos os cantos
Que ficavam misturados
Uns se perdiam dos outros
E depois eram encontrados
Misturam-se as comidas
Comeram crus e assados.

Parecia uma batalha
Onde ninguém se entendia
Era uma torre de Babel
Construída em um só dia
Ninguém ficava parado
Quem não rolava corria
Só quem ficava parado
Era só porque bebia.

E já no final do dia
Amara tava enlouquecida
Pois encontrou Juvenal
Furufando Aparecida
Estavam em baixo do barco
A coisa quase escondida
Mas foram bem descobertos
Pela turma da bebida

Então Amara gritava
Me dêem meu punhal
Eu vou furar essa quenga
No seu órgão sexual
E o meu ex-marido
Não será mais Juvenal
Vou arrancar dele tudo
Não fica nem o bilau.

Juvenal saiu correndo
Já tava sem aza delta
No lugar desse shortinho
Ele estava de cueca
Aparecida chorava
Cobrindo a prexereca
Toda suja de areia
Parecia uma meleca.

Foi quando Batista gritou
Tá na hora pessoal!
Vamos todos para o ônibus
Fim do domingo legal
Vamos voltar para casa
Ainda vai ter sarau
Só lamentamos a treta
Que aconteceu no final.

E assim aconteceu
Dos piqueniques o primeiro
Conseguiram reunir
O melhor do farofeiro
Todos, pessoas de bem
Povo legal e ordeiro
Prometendo que voltariam
No segundo e no terceiro.

E o destino de Juvenal
Com Maria Aparecida?
Ficaram mesmo na praia
Sempre, sempre as escondida?
Agora eles tão juntos
Vivendo bem suas vidas
Escondidos da Amara
Que não lhes dava guarida.

Mas que sempre prometia
Tu me pagas Juvenal
Te garanto que um dia
Ainda vás te dar mal
Vou lhes pegar direitinho
La dentro do matagal
Dela arranco a perereca
E de você corto o pau.