quarta-feira, 31 de julho de 2024

300 contra hum - 300x1

 


                             NIVALDO MELO

quarta-feira, 24 de julho de 2024

A MULHER QUE VIROU PEIXE

 


                   NIVALDO MELO

1

Essa história me foi contada
Quando estava no portão
Daquela casa sombria 
Lá no meio do sertão
Nas terras abençoadas
Por pessoas afamadas 
Padre Cícero e Lampião
2
É um caso meio estranho

Desse que a gente duvida

Mas que de fato acontece

Ao menos uma vez na vida

Podes assinar lá em baixo

Quem lhe conta é cabra macho

Que não tem medo de intriga.

3
O seu Mané de Sabina
Neto da véia Fulô,
Que era filha de Balbina,
Casada com o pescador.
Mais antigo na cidade
E fala só a verdade
Foi ele que me contou.
4
- Seu moço aqui na cidade,
No sítio do véio Romeu,
Que fica perto do rio;
E foi lá que aconteceu,
Esse causo foi bisonho

Que só conto pra estranho
Porque acredita in neu.

5
Aí pegou seu cachimbo
Deu aquela baforada.
A fumaça cobriu tudo,
Quase saio em disparada,
Que fumaça fedorenta!
Fiquei foi tapando a venta,
Até quase a madrugada.
6
Ele estava estudando
A forma de me contar,
Da mulher que virou peixe,
Difícil de acreditar;
Então pedi direitinho,
Para aquele bom velhinho.
Pode agora começar.

7
Foi ai que começou, 
A narrar o ocorrido.
Então baixei a cabeça, 
Desentupi o ouvido.
E vou passar pra vocês,
Da forma que ele fez
Tudo cagado e cuspido.
8
- Foi lá pelos anos trinta
Eu era ainda um menino,
Morava com nós uma véia
Que falava  muito fino,
Mas a véia era tão véia
A cara cheia de péia,

A raça dela era albino.

9
Todo dia ia à velhinha
Ia pra o rio pescar,
Mas nunca trazia peixe
Coisa de se estranhar
Ela nunca pescou nada
Saia de madrugada
Só lá pra noite voltar.
10
As línguas ferinas falavam:
Nesse causo tem história!
Um dia nós segue a véia
Descobre tudo na hora
Ela vai ficar danada
Mesmo sendo madrugada
Nós bota a véia pra fora.

11
Mas ninguém tinha coragem
De ir com a véia ao rio
Na ida estava escuro
De volta estava sombrio
E a veia era tirana
Braba, feito caninana,
Tanto no calor ou no frio.
12
Se arguem falava com ela,.
Era um deus nos acuda
Botava um olhar vermelho,
Dava medo até na muda,
Depois dizia baixinho:
Dou-te um murro no focinho
Que tu vais ficar papuda.

13
E se você insistir,
A coisa fica pior.
Tú tem que mi respeitar,
Pois tenho idade de vó.
Te dou um tapa nas costas,
Abalo o saco da bosta,
Que rasga teu fiofó.
14
E a coisa era esquisita
Nas noites de lua cheia
Dizem que ia para rio,
Lá a coisa ficava feia
Era uma gritaiada, 
Ia até de madrugada
O grito era de sereia.

15
E quem passava no rio
No momento da agonia,
Ficava com muito medo
Porque a água fervia,
Os peixes saiam da água
Então choravam de mágoa
Pense numa bizarria!
16
E lá pela madrugada
Ela deitava na areia,
Ficava se espojando,
Era uma coisa bem feia
E então de pouco a pouco
Te garanto meu caboclo,
Ela virava sereia.

17
Era uma sereia bonita
Calda azul, bem reluzente.
Então entrava no rio
Nadava feito serpente,
Mas ficava muito esperta
Seus olhos ficavam alerta
Só pra ver se vinha gente.
18
E quando ela sentia
Que tava chegando alguém,
Ela saia das águas
Ficava feito refém;
Toda cheia de vergonha
Branca, feito uma cegonha.
Chorava feito um neném.

19
E nas noites de lua nova
A coisa era bem pior,
Como a noite era escura
Ela então saia só;
Escondida e diferente
Então virava serpente.
Era cobra de cipó.
20
Era uma cobra estranha
Como ficava a véia
Tinha os dentes muito grandes
Não tinha escama, só péia.
Andava feito uma cobra
Era feia aquela obra
Era um peixe amoreia.

21
Um dia, oh seu menino,
Arguem disse ao delegado;
O que tava acontecendo
Naquele lugar malfadado,
Então foi verificar
Quando acabou de olhar
Correu feito um veado.
22
Dizendo: Vala-me Deus,
A coisa aqui tá é feia;
E eu que sou da polícia
Não me meto nessa teia.
Jogou logo a farda fora
E está morando agora
Numa sela; na cadeia.

23
Mas um dia meu sinhô,
Numa noite bem bonita;
Deus estava preparado
Pra mudar aquela escrita.
A mulher foi para o rio
De um jeito bem sombrio
Fez uma prece infinita.
24

Cavou um buraco na areia

Botou folha de palmeira

Tirou toda sua roupa

Acendeu uma fogueira

Pôs o fogo no buraco

Ela enrolou-se em trapo

Aguardou a fumaceira.

25

Então ouviu-se um lamento

Do outro lado do rio

Sumiu estrelas do céu

E soprou um vento frio

No rio surge uma luz

Em formato de uma cruz

E sobre o buraco caiu,

26

A luz clareou e tudo

Ficou parecendo o dia

Quem estava no local

Quis correr mas não podia.

E sobre um monte de areia

Surge uma bela sereia

Esbanjando energia.

27

A sereia abre os braços

Depois põe no coração

Faz uns gestos imprecisos

Ensaiou uma canção

E com um cantar bem lento

Ela fez o seu lamento

Em forma de oração.

28
Quero que tires Senhor
Do meu peito esse vazio
Tenhas de mim piedade
Me tire desse sombrio.
E por favor não me deixe.
Então ela virou peixe
Entrou na água e sumiu.








terça-feira, 23 de julho de 2024

FAVO DE MEL

 


             NIVALDO MELO

1
Mais uma bela história,
contada pela vovó.
É algo tão comovente,
Que a garganta dá nó,
as lágrimas fluem nos olhos,
a mente vira um embrolho,
que nem dar pra chorar só.
2
Lembro como fosse ontem,
quando ouvi essa história,
mais que quisesse esquecer,
nunca saiu da memoria.
Agora vou recontar,
parem um pouco pra escutar
vou começar, logo, agora.
No ano não sei de quando,
onde tudo começou,
numa noite de inverno,
bem longe, no interior.
Era um frio tão danado,
que até o próprio diabo,
na fogueira, ele entrou.
4
Para alguém sair de casa,
tinha que ter um trenó.
Uma jovem a Bem-me-quer,
morava com sua avó.
Como amigo tinha um gato,
cujo nome era Ingrato,
manhoso como ele só.
A jovem sempre estava,
olhando para a estrada,
quando ouvia um roído,
ficava meio assustada.
Então colocava a mão,
em cima do coração,
e corria pra sacada.
6
Uma noite o Ingrato,
a acordou de madrugada,
puxando sua coberta,
em direção da sacada.
A jovem então levantou,
e da janela avistou,
alguém vinha na estrada.
Era um som diferente,
com certeza era um trenó,
era um velho veículo,
guiado por um homem só.
Puxando, seis pares de cães,
formados por filhos e mães.
- Correu, chamou sua vó.
8
Bem antes da vó chegar,
ele fez uma parada,
e colocou uma cesta,
o umbral, lá da sacada.
saiu bem de mansinho,
devagar, devagarinho,
e fugiu sem dizer nada.
9
Seu companheiro o Ingrato,
foi o primeiro a chegar,
ficou arranhando a porta,
correndo pra lá e pra cá.
Não abra a porta menina,
Vovó disse com voz fina,
deixemos o dia raiar.
10
Mas nenhum som se ouvia,
vindo do lado de fora.
Nós estamos aqui sozinhas,
porque esperar a hora?
Pela fresta eu estou vendo,
tem algo ali se mexendo.
Vou ver o que é, agora.
E rapidamente ela abriu,
aquela porta pesada.
São três horas da manhã,
ainda é madrugada.
- Pegou a sesta e entrou,
sobre a mesa a colocou,
então ficaram abismadas,
12
O vento fechou a porta.
Algo estava acontecendo.
Ingrato com rapidez,
abriu a cesta mordendo.3
Bem-me-quer se espantou,
E com voz trêmula  falou:
É isso que estamos vendo?
Então confirmou a vó.
É isso mesmo, netinha,
colocaram uma boneca,
ai dentro da cestinha.
É uma pessoa perfeita,
que se encontra na cesta,
parece uma Princesinha.
14
Vovó levanta o presentem
grita; uma criancinha!
Todos ficaram abismado,
com os trajes que ela tinha.
Roupas feitas com esmero,
vestia seu corpo inteiro,
parecendo uma Rainha.
Então a jovem correu,
direto para a varanda.
Viu ao longe um trenó,
tava virado, de banda.
pensou, estão esperando,
para o local foi andando,
mas lá só tinha a caçamba.
16
Tinham sumido os cães,
e também o condutor.
Restara só a caçamba,
e o rastro que deixou.
Encontrou um bracelete,
usado como enfeite,
- da menina, ela pensou.
Viu as pegadas do homem,
que conduzira o trenó,
marcas de pés, tão grandes,
mas que tinham um dedo só.
Nos pés direito e esquerdo.
Ela sentiu tanto medo,
voltou correndo pra vó.
18
Ingrato, ficou por ali,
cavando, usando seu faro
Logo ele encontrou,
algo que era bem caro.
Um cordão com o pingente,
um camafeu diferente,
de um metal muito raro.
Colocou tudo na boca,
e pra casa regressou,
pegou todo os achados,
sobre a messa colocou;
A vovó achou estranho
coisas daquele tamanho?
Então Bem-me-quer falou.
20
As marcas do condutor,
eram grandes, sem igual,
só podem ter sido feitas,
por um ser bem colossal.
Me deu até muito medo,
cada pé só tinha um dedo
entrando para o matagal.
Agora vamos cuidar,
de nossa bela menina
vamos por um nome nela.
Eu sugiro; Joia Fina.
Já sei o que vou fazer.
Deixemos Ingrato escolher,
que em baixo a gente assina.
22
Ingrato ficou fofinho;
protagonizava o papel.
Ficou na ponta dos pés,
Miou, falando é MIEL.
Vó e neta se olharam,
e rindo, elas aprovaram.
Seria FAVO DE MEL.
Já passara 15 anos,
ninguém veio procurar.
Vovó tava tão velhinha,
que mal podia andar.
E a jovem Bem-me-quer,
hoje uma bela mulher,
Fina no vestir e falar.
24
Outra vez uma nevasca,
como há 15 anos atrás.
Pela manhã, batem a porta,
Atenderam; era um rapaz.
Falou assim, com timidez,
preciso falar com as três.
sobre fatos bem reais.
Eu vou me apresentar;
meu nome é Wanderlei,
estou aqui em missão,
enviado por meu Rei.
Pra procurar sua filha,
retirada da família
se a encontrar, voltarei.
26
Esse rapto aconteceu,
há quinze anos atrás.
A criança foi roubada,
por um gigante voraz.
Brabo como ele só,
guiando um velho trenó,
astuto e muito sagaz.
- E que reinado é esse,
que nunca ouvimos falar?
- É de um lugar distante,
tem que atravessar o mar.
Foi um ano de viagem
pra chegar nessa paragem,
quase pedi pra voltar.
28
Trago comigo alguns itens,
que podem elucidar,
pra mostrar toda verdade.
umas provas vou mostrar.
As roupinhas da criança,
o camafeu de herança,
e pulseira pra enfeitar.
Então mostrou as réplicas,
de tudo que havia falado,
fez referência ao pingente.
Tava tudo confirmado.
A verdade era cruel,
era bela FAVO DE MEL.
ele a tinha encontrado.
30
- E como chegaste aqui,
já que o mar é distante?
São mais de 200 léguas
e chegaste um instante?
- Em um tapete voador,
que um amigo comprou,
de um cavaleiro andante.
- Como se chama a criança,
desse reino tão distante?
- O nome da mãe é Perola,
o nome do pai Galante.
A Princesa seria Rosa,,
a mais prendada e formosa,
lá do Reino, Fulgurante.
32
- Essas são as minhas netas,
A primeira é Bem-me-quer,
essa belíssima flor,
minha menina mulher.
Uma jovem bem prendada,
tranquila, muito educada
líder da casa ela é.
A segunda é a querida,
que pra nós caiu do céu.
Ela só tem, quinze anos,
seu nome é Favo de Mel.
Ela é quem você procura,
é um anjo de candura,
um verdadeiro troféu.
34
Esse aqui é nosso pajem,
o nome dele é Ingrato.
É o guerreiro mais forte,
aqui disfarçado em gato.
Defende nós, seus parentes,
usando unhas e dentes,
mas não agride, é pacato.
O jovem, recém chegado,
ficou mudo e cabisbacho,
em sua testa morena,
caiam cabelos em cacho.
Seus olhos lagrimejaram,
e seus lábios sussurraram:
Graças a Deus. eu relaxo.
36
Bem-me-quer começa contar,
tudo sobre a Favo de Mel.
O jeito que ela chegou,
em um momento cruel.
O tempo muito nevado,
todo mundo enclausurado;
um verdadeiro escarcéu.
Então o jovem começa,
falar sobre a transferência.
Da jovem Favo de Mel,
tinha de ir com urgência.
A vó e Bem-me-quer falaram,
não somos nada contrario,
mas queremos uma carência.
38
Havia chegado a vez,
De Favo de Mel falar.
- Só saem daqui as quatro,
nisso podes acreditar.
E se houver contestação,
aqui de nosso rincão,
Só você que vai viajar.
Então Ingrato rosnou,
e foi pra cima da mêsa,
Vovó falou para o jovem,
você pode ter certeza,
é que aqui nesse local,
nosso Ingrato é maioral,
sai logo em nossa defesa.
40
O jovem pediu licença,
saiu, mas logo voltou,
trouxe em baixo do braço,
algo feito um cobertor,
- Isto aqui não é enfeite,
lhes apresento o tapete
que um velho amigo doou.
Vou estender sobre o chão,
pra ver se cabem os cinco.
Afastem todos os móveis,
vamos limpar o recinto.
Quando tiver arrumado,
quero que tenham cuidado,
por favor, apertem os cintos.
42
Quando estendeu o tapete,
foi grande a admiração.
O tapete era gigantesco,
parecia uma embarcação.
Com apenas um olhar,
ele se pôs a balançar.
e logo levantou do chão.
43
vou ter que comunicar,
tudo para os meus Reis,
de como aqui vim chagar.
Que já encontrei sua filha,
aquela qua tanto brilha,
e que breve ela vai voltar.
44
Pegaram então uma ave,
chamado Garça real,
era um pássaro correio,
criada lá no quintal.
Depois de tudo escrito,
colocaram em seu bico,
algo em forma de jornal.
Esperaram uma semana,
fazendo os preparativos.
Levariam coisas leves,
alguns móveis exclusivos.
pra elas era um deleite
por tudo sobre o tapete.
E partiram em definitivo.
46
Planando sobre as nuvens,
o tapete ia singrando,
voariam por dez dias,
logo estariam chegando.
Passavas sobre florestas,
no mar, navios de pesca,
rios e montanhas passando.
Tinham levado comidas,
pra consumir na viagem.
Na hora de descansar,
repousavam ali na nave.
Demoravam pra dormir,
a preferencia era curtir,
admirando as paisagens.
48
Ao completar nove dias,
o barco tapete, baixou.
Querias conhecer as terras,
que o Rei Galante herdou,
e as da Rainha Pérola,
muito fértil e muito bela,
que seu pai presenteou.
Voaram durante o dia,
durante a noite também.
No fim do décimo dia,
podiam dizer amém.
- Então veio a decepção,
no lugar da atracação,
não encontraram ninguém.
50
O rapaz ficou constrangido,
Vovó estava arrasada,
Bem-me-quer meio confusa,
Não entendia era nada,
em um canto pesarosa,
Favo de Mel bem dengosa.
Quando ouviram passadas.
Chegaram o Rei e a Rainha,
e mais cinquenta soldados.
Queremos que fiquem quietos,
vocês tão presos e cercados.
Serão levados para o poço,
não façam nem alvoroço,
o de vocês tá guardado.
52
A nossa filha querida,
faz dias foi encontrada.
Ela está lá no castelo,
por soldados bem guardada.
É nossa filha legal,
pois tem a marca real,
bonita e bem preservada.
É disso que estão falando?
Gritou a Favo de Mel.
Mostrando no peito a rosa,
como pedra de um anel.
Se a impostora está ai,
tragam logo ela aqui,
vamos mandala ao bordel.
54
Trouxeram logo a outra,
Nervosa, muito, assustada.
Pediram; mostre a marca,
estava quase apagada.
Era algo sem noção,
um desenho feito a mão.
Ficou desmoralizada.
Os pais pediram desculpas,
por todo constrangimento
- Premiaram o emissário,
custeando o casamento.
Bem-me-quer e Wanderlei,
receberam daquele Rei,
O Reino do Pensamento
56
A vovó de Bem-me-quer,
foi morar no mesmo Reino,
nunca mais se separou,
de seu tapete vermelho.
Logo os bisnetos chegaram,
ficaram sobre seu amparo,
pra eles, era ela o espelho.
O Reino que receberam,
cresceu muito e progrediu,
parecia Reino encantado
como ninguém nunca viu.
Nas ruas era uma euforia,
Bem-me-quer só alegria,
Wanderlei, morreu senil.
58
Favo de Mel com os pais,
para eles assim falou:
Quero casar com Ingrato,
Sempre foi meu protetor.
Mas ingrato não é gente,
deves está fraca da mente.
O monarca assim falou.
59
E apontou para Ingrato,
que estava sobre o sofá.
No local tava um Príncipe,
bonito de se admirar.
Pegou na mão da princesa
e disse: Suas Realezas
com ela quero casar.
60
Festas por quase cem dias,
pra Ingrato e Favo de Mel.
Bebidas e comidas grátis,
Os Reis estavam no céu.
Se encontrarem defeito,
Por favor, mostrem respeito.
E APLAUDAM MEU CORDEL




.



AS ANDORINHAS

 


                   NIVALDO MELO

   Sumiram com as Andorinhas, que 
víamos todas as tardes revoando 
aos milhares diante de nossas casas.
  As mesmas que anunciavam ao final
do outono, a chegada da primavera.
  Com elas se foram as lavandeiras,
as viuvinhas os anuns, pardais e até 
as borboletas.
  Substituiram as velhas cercas onde 
elas costomavam pousarpor muros 
quase intransponíveis.
  Com elas se foram, os valores morais,
o respeito, a verdade e a liberdade.
  Quando se foram as Andorinhas,
sumiram com a dignidade.
  Surgiram então, a intolerância, a 
chacota o desrespeito, o sodomizo.
  O que seremos nós, no futuro sem 
Andorinhas?




O MATUTO NA NASA

 


                             NIVALDO MELO

1

Essa história aqui contada

Vem de nossos devaneios

Cartas por nós não escritas

Que nunca foras aos correios

Belezas de nossas mentes

Com narrações diferentes

Contadas, mas sem recheios.

2

Mostramos nesse cordel

Que não existe o impossível

Quando se sonha com medo

O bonito fica horrível

Mas quando o sonho é real

Tudo é muito natural

Ali não existe o sofrível.

3

Vamos direto ao assunto

Contado nesse cordel

Pedido por um amigo

Pra mim que sou menestrel

Saído de sua mente

É um fato diferente

Que ponho nesse papel.

4

Bem no sertão do Nordeste

Nasce um caboclo brejeiro

Forte como um bode brabo

Sai gritando eu vim primeiro

É o pivô de nossa história

E que vou contar agora

Para o povo brasileiro.

5

Nem precisou de parteira

Nasceu de parto normal

Pesando mais de três quilos

Lá no fundo do quintal

Pai e mãe muito contente

Foi um parto diferente

Chão limpo, sem matagal.

6

A mãe coloco-o ao peito

Na mesma hora mamou

Sugou o leite que tinha

Mas a mãe não se importou

Era seu primeiro filho

Que veio cheio de brilho

Papai do céu que mandou.

7

Com menos de sete meses

Começou logo falando

Quem via nem acreditava

Vendo o menino aprontado

Corria, mas não cansava

No fim do dia rezava

Passava a noite sonhando.

8

Sonhava que estava voando

Vendo tudo lá de cima

Casas, riachos e morros

Aumentando a autoestima

Voava em cavalo alado

Sem sela, mas bem guardado

Suas rédeas eram as crinas.

9

Na fase de adolescência

Se mostrava destemido

Falava pra todo mundo

Vou pros Estado unidos

Trabalharei lá na NASA

Fugirei de minha casa

Lá serei bem-sucedido.

10

Falava para seus pais

Que um dia iria voar

Explorar outros planetas

Conhecer outro lugar

Das nuvens iria além

Sozinho ou com alguém

Difícil era acreditar.

11

Um dia o Zé Matuto

Do lugar se escafedeu

Procuraram por todo lado

Ele nunca apareceu

Deram parte na polícia

Mas o maturo era artista

Foi atrás do sonho seu.

12

Ninguém sabe como foi

Mas ele juntou dinheiro

Sem a passagem de ida

Fugiu para o estrangeiro

Com uma malinha de mão

Na bagagem de um avião

Voou todo o dia, inteiro.

13

Quando o avião parou

Ele mudou de lugar

Recolheram a belonave

De volta para o hangar

Ninguém notou o matuto

Muito liso, mas enxuto

Ele conseguiu se mandar.

14

Trocou logo sua roupa

E saiu bem de mansinho

Se esgueirando de cócoras

Encontrou logo um caminho

Heita matuto arretado

Correndo mais que um veado

Conseguiu chegar sozinho.

15

Pra ele foi bem normal

Fazer o que tinha feito

Pois lá no meio do sertão

Corria solto no eito

Plantando e cortando mato

Era trabalho de fato

Torava mata no peito.

16

A NASA fica em Washington

O lugar onde ele chegou

A capital dos Esteites

Foi ali que ele aportou

Só foi andar um pouquinho

E logo cedo, cedinho

No portão ele parou.

17

Ao chegar ficou parado

Admirando o local

Mas foi logo abordado

Por um velho oficial

Que disse logo gritando

Vamos logo circulando

Vaza daqui marginal.

18

Ele levanta os dois braços

E diz para o oficial

Tenha calma meu amigo

Não sou nenhum marginal

Sou apenas um brasileiro

Que vim para o estrangeiro

Pois aqui é mais legal.

19

O meu sonho sempre foi

Trabalhar aqui na NASA

Para mim esse lugar

É como estar lá em casa

Vim procurar sua ajuda

Espero que me acuda

Pois meu peito está em brasa.

20

Você é bom de conversa

Eu vou tentar te ajudar

Vou te fazer três perguntas

E se você não errar.

Vou te arrumar um emprego

Desses que muitos têm medo

Garanto que vás gostar.

21

Mas se você matutinho

Não souber me responder

Vou te dar um safanão

Quero ver você correr

E se tu aqui voltar

Garanto vás apanhar

E podes até morrer.

22

Vamos logo as perguntas

Apena uma por vez

Com certeza eu respondo

Antes que contes até três

Eu sei tudo sobre a NASA

Nos livros que tenho em casa

Li todos em menos de um mês.

23

O que significa NASA?

- Nati. Aero. Space  Admin.

O nome a e a tradução.

Admin. Nacio. Espaço Aéreo.

Está na primeira lição

O nome tem som de aço

Se errei peço perdão.

24

Conseguistes acertar

Esta primeira pergunta

Só estão faltando duas.

Esta vai ser mais enxuta

Vamos ver se tu acertas

Se tens a cabeça esperta

Vou dizer que és batuta.

25

Vamos direto à segunda

Qual é o lema da NASA?

“For the Benefit of All"

Foi o que li l lá em casa

“Para o Benefício de Todos"

Digo cheio de denodos

Se eu errei, grite vaza!

26

Te saístes muito bem

Nas duas que perguntei

Vou ver sabes a terceira

- Mandes que eu estudei

Decorei virgula e ponto

Esperando esse encontro

Mas eu sei que nada sei.

27

Então o oficial tirou

De seu bolso um livrinho

Abriu na página do meio

Disse algo bem baixinho

Se tua mente é esperta

Quero ver se tu acerta,

Responda bem direitinho.

28

Qual o salário que ganha

Nosso astronauta melhor?

Responda por mês ou ano

- Se ele for o maior

Cem mil dólares por ano

Nada por baixo do pano

Para o astronauta mó.

29

O oficial ficou mui pasmo

Quando ele respondeu

Disse: Cara tu és o cara

Que por aqui apareceu

Volte na próxima semana

Pois um trabalho bacana

Por mim você recebeu.

30

O matutinho saiu

Dalí todo saltitante

Ía conseguir entrar

Naquele lugar brilhante

Era parte se seu sonho

Vindo de um lugar estranho

Realizar num instante.

31

Durante toda semana

Estudava mais e mais

Se viessem outras perguntas

Não ia ficar pra traz

Era muita responsabilidade

Pois sabia que a maldade

Tem na frente o satanás.

32

E na semana seguinte

Na mesma hora e local

Tava o matuto presente

Na frente do general

De gravata e paletó

Era seu terno melhor

Sem parecer marginal.

33

O oficial lhe aparece

Com seu terno camuflado

Cheio de laços de fitas

Estrelas pra todo lado

Os sapatos eram só brilho

Medalhas bem no peitlho

E o Zé matuto abismado.

34

Vamos entrar meu amigo

Te levo ao superior

Ele quer te conhecer

O nome dele é Senhor

Não vai te mostrar a cara

É a figura mais rara

Dentro de nosso setor.

35

Não podes ficar com medo

Na presença do Senhor

Ele é muito imprevisível

Tem diploma de doutor

Física, química, astrologia

Matemática e economia

Em tudo é professor.

36

Tou um pouco acabrunhado

Garanto meu general

Mas pode ficar mui tranquilo

Eu não vou me sair mal

Se a entrevista for boa

Vou sair sorrindo atoa

Quero um emprego legal.

37

Chegaram na portaria

Na frente ele entrou

Bateram muita continência

Por onde ele passou

Prédio bonito, arretado

Com salas pra todo lado

Mas de cem ele contou.

38

Lá no final do trajeto

A sala do maioral

As portas foram abrindo

Ao chegar o General

Era tudo bem vigiado

Olheiros pra todo lado

Dava até pra passar mau.

39

Quando entraram na sala

A penumbra era total

Quase não se via nada

Só a mesa principal

Em cima tinha uma luz

E um cara de capuz

Era o Senhor maioral.

40

Uma voz estranha pergunta;

Quem é você meu rapaz?

Por acaso és espião

Quero ver os teus anais.

Me contes tua história

Já que tens boa memória

Conta da frente pra traz.

41

Estou aqui meu Senhor

Vim procurar um emprego

Eu nasci lá no meu sertão

De nada eu tenho medo

O meu nome é Zé matuto

Dizem que eu sou astuto

E não estou falando grego.

42

Falaram que sabes tudo

Aqui do nosso setor

Respondeste três perguntas

Todas sem tirar nem pôr,

- É que li muito sobre a NASA

Muitos livros lá em casa

Isso garanto ao Senhor.

43

Me pediram um local

Para você trabalhar,

Por enquanto temos uma vaga

Bem lá dentro do hangar

Limpar peças dos foguetes

Só com panos com azeites

Deixando tudo brilhar.

44

É disso que eu preciso

Trabalhar aqui Senhor

Garanto que meus serviços

Serão feitos com amor

Pois eu amo esse lugar

Muito antes deu falar

Pergunte ao meu professor.

45

Posso fazer umas perguntas?

Perguntou o maioral.

Quero ver e bem conheces

Aqui o nosso local

São dez perguntas somente

Por favor não se apoquente

Não quero que passes mau.

46

É a primeira pergunta:

Que é o NACA, data de fundação.

Comitê Nac. Adm. Aeronautica.                                      

Veio dela nossa formação

Ano quinze, séculos passados

Disso estou bem informado

Orgulho dessa nação.

47

Vamos a segunda pergunta

Em 72 quantos pisaram a lua?

Doze ali caminharam

Verdade nua e crua

Último voo tripulado

Pense num feito arretado

Parecia estarem na rua.

48

O Senhor ia perguntando

O Zé matuto respondendo

O chefe não acreditava

Naquilo que estava vendo

Um matuto Nordestino

Jogando o seu destino

E seu cartaz só crescendo.

49

Veio a décima pergunta

Essa é difícil demais

A resposta está escondida

Dentro dos nossos anais

Sei que posso responder

Com certeza, podes crer

Eu estudei foi demais.

50

Nos nossos últimos dez anos

Quantos planetas se descobriu?

Foi nesse exato momento

Que o Zé matuto sorriu

Disse já estou no trabalho

Sentando no assoalho

Disse: Puta que pariu!

51

O telescópio sonda Kepler

Em um só dia descobriu

1284 novos planetas

Quem em seu foco surgiu

Descobriu 100 mil estrelas

Queria estar lá pra vê-las

Poucos foram os que viu.

52

Neste momento o Senhor

O Manda-Chuva geral

Levantou de sua poltrona

De disse para o General:

Esse cara é diferente

Tem que trabalhar com a gente

Pra mim ele é surreal.

53

Até aquele momento

O senhor não tinha rosto

Mas quando ele se mostrou

Causou tremendo alvoroço

Não era ele, era ela

A mulher mais linda e bela

Que Deus ali tinha posto.

54

Ninguém vai poder saber

Que o Senhor é senhora

E se alguém comentar

Vai ser posto para fora

E vai ser do pais banido

Sem direito a um abrigo

Sem muletas pra escora.

55

Seguimos com Zé matuto

Motivo de nossa estória

Que consegui seu emprego

Devido sua memória

Trabalhando ali na NASA

Se lembrando da Ceasa

Motivo de muita glória.

56

No trabalho de limpeza

Estava sempre pensando

Como vou chegar na lua

Mesmo acordado, sonhando

Eu vou traçar meu destino

Daqui eu saio fugindo

Mas saio daqui voando.

57

Durante dias e noites

Planejou um meio legal

De fugir dali pilotando

Numa nave espacial

Era um plano muito ousado

Mas se muito bem planejado

Era um plano genial.

58

Durante o ano seguinte

Limpava bem devagar

Peças da nova espaçonave

Que logo iriam lançar

Para o espaço sideral

Não seria nada mal

Ele iria pilotar.

59

E no dia planejado

A grande nave partiu

Levando consigo um matuto

Que ali na NASA surgiu

Cheio de sonhos na vida

Que pra ele bem vivida

Mas o seu plano faliu.

60

Esqueceu alguns detalhes

Uma falha de instante

A nave por ele escolhida

Voava sem tripulante

Era uma ida sem volta

Vitória, nunca derrota

Foi um sonho delirante.

61

Depois de atingir altura

Alguém na NASA só viu

Uma mão de Nordestino

No seu monitor surgiu

Com o polegar arreado

Tava decepcionado

Foi assim que ele partiu.

62

Dessa forma nosso herói

Não fez parte da história

Apesar de sonhador

Nunca alcançou a gloria

Seu corpo está no espaço

Dentro de um tubo de aço

Onde ficou sua gloria.

63

Mesmo assim o Zé matuto

Chegou onde bem queria

Olhar a terra de cima

Fez tudo com ousadia

Conheceu novos planetas

Viajando em seu cometa

Jamais ele voltaria..





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