sábado, 24 de agosto de 2019

A CAPELA DE VERDADE


A CAPELA DE VERDADE.
Nivaldo Melo
1
Eu vou contar pra vocês
Um causo interessante
Que aconteceu num lugar
Que daqui é bem distante
Não fique injuriado
É um fato já passado
Nele não tem meliante.
2
Numa cidade bonita
Com um povo sem maldade
Homens, mulheres e crianças
Convivendo em amizade
Acho que é a única no mundo
Onde não tem vagabundo
Essa cidade é Verdade.
3
Imaginem um lugar
Com casas bem coloridas
E que de dia na praça
Os velhos jogam biriba
O povo de lá não mente
Se tem alguém indecente
Será do lugar banida.
4
A noite se reuniam
Para contarem historias
Dessas que ficam presentes
Dentro de nossa memória
Uma história só por dia
Quem gostava aplaudia
Pois gostou da oratória.
5
Eu como bom cordelista
Fui visitar o lugar
Pois queria ali ouvir
Algo que pudesse passar
Para o meu fiel leitor
Uma história de valor
Que passo agora a narrar.
6
Prestem muita atenção
Acreditem que é verdade
E se achares estranho
Se calem por caridade
Sou cordelista famoso
Não sou nenhum mentiroso
Sou fã da honestidade.
7
Nessa noite quem contou
A história foi o padre
Que revezou com a freira
Pra reforçar que é verdade
Começou a narrativa
Da forma mais criativa
Que havia na cidade.
8
“Na época que cachorro
Se amarrava com linguiça
Coelho perdia corrida
Até pra bicho preguiça
Elefante levantava voo
Mesmo sem ter um apoio
E fofoqueira era omissa.
9
Apareceu na cidade
Um anjo muito legal
Daquele bem divertido
Anjo da cara de pau
Foi dizendo ao padre Bento
Quero que você tome tento
Mas de forma natural.
10
O tal anjo apareceu
No altar mor da igreja
E falou pra o padre Bento
O que é que tu deseja?
Peças de imediato
Que eu e atendo no ato
O que você mais almeja.
11
O padre Bento nervoso
Falou sem pestanejar
Construa uma catedral
Coloque nesse lugar
O anjo sem um sorriso
Com um aspecto bem siso
Aqui está; pode entrar.
12
O padre Bento na hora
Saiu correndo; endoidou
Até hoje está correndo
Nunca mais ele parou
- Onde está a catedral?
Perguntou o Juvenal.
- Um vendaval derrubou.
13
O povo ficou nervoso
Com o que contou padre João
É que eu estava ouvindo
Prestando muita atenção
Estava meio abismado
Por ter ouvido calado
Toda aquela narração.
14
Como o povo é conhecido
Por falar só a verdade
E eu como um estranho
Tava na localidade
Tinham que criar um jeito
Algo tinham que ser feito
Por alguém lá da cidade.
15
Foi nessa hora que a freira
Assumiu a narrativa
E falou alto e em bom tom
Eu tenho muita saliva
Continuo a história
Faço com orgulho e gloria
Vou lhes mostrar a missiva.
16
Levantou bem a batina
Tirou de baixo um cordel
Parecendo um velho livro
Isso causou escarcéu
A freira tava sem nada
Estava mesmo pelada
Por baixo daquele véu.
17
Onde estava escondido
O velho livro da freira?
A batina era sem bolsos
E eu fui cair na asneira
De perguntar pra irmã:
Onde estava o talismã?
“Preso entre as duas beiras”!
18
Então falou o prefeito:
- A Irmã é da verdade
Não fique encabulado
Com o povo da cidade
Continuemos história
Motivo da oratória
De nossa querida madre.
19
A irmã abriu o livro
Sem se importar com o lugar
Nem com que estava escrito
E começou soletrar.
Eu pensei; nessa retreta
Se juntar letra por letra
Quando é que vai terminar?
20
Parece que a freirinha
Leu logo meu pensamento
- Estou só na introdução
Fique quietinho jumento!
Se não tiver paciência
Vá procurar outra crença
Ou cale nesse momento.
21
Falou assim nossa freira
Por favor prestem atenção
Onde parou a história
Narrada por Padre João
Eu agora continuo
Nunca vai haver recuo
Nessa nossa narração.
22
“No vendaval de quarenta
Quando catedral caiu
No lugar da bela igreja
O nosso lago surgiu
O lago cheio de peixes
Se pescava só de feixe
Quem me contou é que viu.
23
Com isso nossa cidade
Ficou cheia de turistas
Gente de muito dinheiro
Milionários, artistas
Chegou a prosperidade
Pra toda comunidade
Fomos capas de revista.
24
E foi mesmo nessa época
Que o mesmo anjo voltou
Tava de cabelos brancos
Pois muito tempo passou
O anjo tava velhinho
Mas demonstrando carinho
Dessa forma ele falou:
25
Meu povo estou de volta
E voltei par terminar
A obra da catedral
Que coloquei no lugar
Faltava o acabamento
Por isso nesse momento
Vamos todos trabalhar.
26
Onde está o padre Bento
O meu velho companheiro?
Que pediu para construir
Mesmo sem ter um pedreiro
Nossa bela catedral
Que a morada principal
De nosso bom padroeiro.
27
Abanou as velhas asas
E começo a perguntar:
Onde está a catedral
Que eu pus nesse lugar?
- Um vendaval derrubou
E um lago se formou
É desse jeito que está.
28
O velho e cansado anjo
Ficou meio injuriado
Tirou da asa uma pena
E num gesto tresloucado
Jogou a pena no chão
Se ouviu uma explosão
Tava o fato consumado.
29
No lugar que a pena caiu
Um vento forte soprou
Fazendo muita poeira
Um funil logo formou
Foi um barulho do cão
Feito pelo furacão
Então o anjo gritou:
30
Se ajoelhem meu povo
Façamos uma oração
Para nossos padroeiros
São Cosme e são Damião
Eles irão nos atender
E vão mostrar pra você
O caminho da salvação.
31
Rezemos o Padre nosso
De um modo diferente
Pra desfazer os mal feitos
Rezem de trás para a frente
Foi feito como foi dito
Do anjo se ouvia o grito
“Plantemos nossa semente”
32
Todo de olhos fechados
Ajoelhados no chão
Formaram uma corrente
Elos unidos por mãos
E em menos de um minuto
O lago ficou enxuto
Causando admiração.
33
O lugar daquele lago
Nossa capela surgiu
É a capela mais bonita
Que uma pessoa já viu
É que o anjo errou a pena
Ele usou uma pequena
Quando o milagre surgiu.
34
Foi uma decepção
Para o povo do local
Queriam algo suntuoso
Esperavam a Catedral
Não veio nem uma Igreja
Então surgiu a peleja
Uma capela? Foi mal!
35
Foram pra cima do anjo
Querendo lhe esganar
O anjo tirou outra pena
Começou a abanar
Foi então que uma fumaça
Surgiu no centro da praça
Botando todos pra chorar.
36
O anjo ficou muito bravo
E pra população falou
Eu vou lhes dar um castigo
Castigo pra pecador
Transportou a capelinha
Para o morro que ali tinha
E mil degraus colocou.
37
A freira então apontou
Num movimento bem leve
Olhei para a direção
Com olhos de quem escreve
Então à capela surge
Ali por trás de uma nuvem
Como que fosse de neve.
38
Fiquei todo abestalhado
Com toda aquela visão
Por cima da capela se via
Um fabuloso clarão
É o brilho de uma estrela
Assim falou logo a freira
E confirmou padre João.
39
Lá na capela se vai
Apenas uma vez por ano
No dia dos padroeiros
Pois ninguém é leviano
Pra curtir os mil degraus
Se tentar vai passar mal
Castigo do soberano.
40
Dessa forma desisti
De conhecer a capela
Continuo acreditando
Ela é mesmo a mais bela
Falam que é colossal
Como a velha catedral
Que só se vê em novela.
41
Eu como bom cordelista
Registro tudo em papel
Tudo cantado em versos
Como faz um menestrel
Feito com carinho e amor
Acredite meu leitor
Termino assim meu cordel.
42
Entra na perna do pinto
E sai na perna do pato
Não sei que o meu escrito
É um fato ou um boato
Se alguém quer creditar
No que acabei de narrar
Para todos eu fico grato.

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