NIVALDO MELO
1
Férias de final de ano,
Fomos passar na fazenda.
Essa história é bem hilária,
Espero que você entenda.
É a primeira história
rural,
Bem longe da capital,
Vou lhes contar sem
emenda.
A fazenda de meu biso
Nosso vovô Manoel
Ele era conhecido
Como o último Coronel
Diziam já ter um século
Já tinha um tetraneto
O Vovô gosto de mel.
De voz mansa e delicada
Falava muito baixinho
Muitas vezes pra ouvi-lo
Chegávamos muito pertinho
Nessa hora ele gritava
E nem você esperava
Vá pra lá seu menininho!
Com o susto você corria
Então o vovô resmungava
Ele está com medo do velho.
Era assim que ele brincava
Só tou querendo assustar
É jeito de velho brincar
E na hora ela gargalhava,
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Pra nós era só alegria
Vê Coronel Manoel
França
Rever os tempos de
menino
E voltar a ser criança
Íamos com ele pescar
E no vê-lo ainda nadar
Nele tínhamos confiança.
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O primeiro do outro
lado
Tem de prêmio uma
pataca
Era assim que ele
chamava
As bezerrinhas das
vacas
Quem não queria ganhar?
Só não conseguia levar
Pois eram pesada
“paca”.
Era muito divertido
As férias lá na fazenda
Pela manhã bem cedinho
Já começava a contenda
Corríamos para o riacho
Comer banana do cacho
Ouvirmos histórias e lendas.
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E quando chegava a noitinha
Tinha um lugar especial
Era um caramanchão
Construído lá no quintal
Em um formato circular
Com bancos para sentar
Pra nós era um arraial.
Primos e irmãos sentavam
Até o Coronal chagar
Quanto ele se aproximava
Era a hora de levantar
Ele ficava meio sem jeito
Dizia; isso é que é respeito
Mas todos podem sentar.
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E durante toda a férias
A cada noite uma estória
Sempre tinha fatos novos
Que lhes vinha a memória
Um dia ele todo prosa
Hoje um grilo cor-de-rosa
Terá sua noite de gloria.
Pediu um copo de suco
E temperou a garganta
- Esse grilo que eu falo
Ele não trila só canta
Uma canção diferente
Dessas que prendem a gente
Quem a ouve se espanta.
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Fiquem todos em silencio
Fechem os olhos pra esperar
Pode demorar um pouco
Mas assim que ele chegar
Vai se fazer bem presente
E com certeza a gente
Vamos parar pra escutar.
Passaram-se alguns segundos
Pra gente uma eternidade
Quando o biso fez psiu!
Está na hora da verdade
Então se ouve um som
Um pouco fora de ton.
Ninguém estava a vontade.
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O som foi se aproximando
E sobre a mesinha parou
Naquele exato momento
Todo mundo se espantou
Tinha um grilo cor-de-rosa
Sobre a mesa e todo prosa,
Na mesma hora cantou.
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Que ninguém ali entendia
Enquanto o grilo cantava
Nosso biso a traduzia
A letra era um tilintar
Que era voz dele falar
Só o nosso biso sabia.
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A letra daquela canção
Era mais ou menos assim
“Ser um grilo cor-de-rosa
Garanto que é muito ruim
Sou o único dessa cor
Me chamam grilo doutor
Ninguém acredita em mim”.
“Quero pedir para todos
Por favor prestem atenção
Moro dentro de uma arvore
De dia não saio não
Tenho medo de predador
Por causa de minha cor
Não dar pra ser refeição”.
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“Gosto muito de crianças
Devido suas carências
Sou um grilo diferente
Estou em suas presenças
Estão todos estatelados
Me olhando admirados
Mostrando suas inocênciaS"
“Eu não sou desse país
Pertenço a outro rincão
Por isso o meu cantar
É de difícil compreensão
Eu venho lá do oriente
Da terra do sol nascente
Lugar chamado Japão”
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Olhávamos pra nosso biso
Com muita curiosidade
Será que estávamos vendo
Um grilo cantar de verdade?
Mas o biso apenas sorria
Como nós se divertia
Ali não tinha maldade.
Ficamos por muito tempo
Admirando tudo aquilo
O Coronel nos alertou
Nunca toquem nesse grilo
Espero que me entenda
É a mascote da fazenda
Tá na placa em grande estilo.
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Qual o nome dessa fazenda
Alguém pode me responder?
- Não é Fazenda do Mel?
- Está muito errado você.
Tem uma placa glamurosa
Fazenda do Grilo-de-rosa
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Quando olhamos pra a mesa
O grilo havia sumido
O biso disse pra gente
- Depois de tanto alarido
O grilo ficou com medo
E partiu foi muito cedo
Pra ficar bem escondido.
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E vamos vê-lo novamente?
Amanhã ou depois, talvez
Queremos o grilo por aqui
Será surpresa pra vocês
Amanhã vamos voltar
E todos vamos apelar
Para velo outra vez.
Eu, minha irmã, e os primos
Estávamos todos encafifados
Esperando que chegue a noite
Momento mais aguardado
Queríamos o grilo novamente
Pra deixar todos contentes
Passamos o dia amoitados.
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A tarde perguntamos ao biso
Será que hoje ele vem?
E velho fazendo gracinha
Nos pergunta. Ele quem?
O grilo!!! Ficou na memória
Será que ele conta histórias?
Vai nos contar, se as tem.
Logo que a noite chegou
Corremos pra o caramanchão
A cozinheira então gritou
Vocês não vão janta não?
Meu tio deitado na rede
Tão sem fome, mas com cede
Cede de muita emoção.
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Éramos apenas crianças
Que morávamos na cidade
Qualquer coisa diferente
Pra gente era novidade
Principalmente no instante
Que vimos um grilo cantante
Pra todos nós, novidade.
Voltamos pra casa grande
Sede da velha fazenda
Que pertencia a família
Um lugar cheio de lendas
Tinha horta, e pomar
Um rio pra gente pescar
Pra moer a cana, moenda.
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No momento o que importava
Era a aparição do grilo
E ouvirmos ele se expressar
Cantando sem estribilho
Mas quando chegasse a hora
Íamos pedir uma história
Mesmo que fosse sem brilho.
Mas para nossa frustação
Essa noite ele não chegou
Ficamos sem a presença
Do grilo e do bisavô
O velhinho foi dormir cedo
A gente ficou com medo
Até que vovó chegou.
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Fiquem tranquilos crianças
O Coronel tá cansado
Hoje foi um dia tenso
Dia de embarcar o gado
Como ele tem muita idade
Não ficou muito à-vontade
Por isso já está deitado.
A vovó a dona Pérola
Filha do seu Manoel
Ela era a Mãe de meu pai
Que é neto do coronel
Todos da mesma família
E seguiam a mesma trilha
Cada um com seu papel.
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Vou contar para vocês
Sem entrar na contramão
Como o grilo chegou aqui
Dele só tem no Japão
Papai o trouxe de lá
Foi difícil de embarcar
Trouxe-o fechado na mão.
Compro-o de um japonês
Que negociava insetos
Meu pai gostou do grilinho
E quis ter ele por perto
E logo que aqui chegou
Lá na arvore ele o soltou
Depois ele conta o resto.
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Mas se vocês quiserem
Eu lhes conto uma história.
- É claro que nós queremos!
Vai ser pra gente uma gloria
Ouvir a senhora nos contar
Alguma história espetacular
Pra nós mais uma vitória.
Foi então que ela chamou
A velhinha cozinheira
Ela veio toda sorridente
Sentou em uma cadeira
- O que a senhora quer?
- Uma história, mulher!
Daquela bem verdadeira.
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E sem mais nenhuma delonga
A cozinheira começou.
Eu vou lhes contar a história
De alguém que aqui chegou
Há uns trinta anos atrás
Apareceu nos currais
Do jeito que ninguém notou.
Em um dia bem cedinho
Quando fui buscar o leite
Encontrei o ordenheiro,
Sentado num tamborete
Falando não sei com quem
Procurei não vi ninguém
Ali naquele piquete.
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Fiquei só observando
Quem é que estava ali
Quando vi que nada tinha
Perguntei: quem está aí?
Uma voz me respondeu
Eu sou um amigo seu
E vim pra me divertir.
Sou apenas um Curupira,
Estou aqui de passagem
Você tem bom coração
Vou mostrar minha imagem
E logo o mato de mexeu
E um menino apareceu
Poensei que era miragem.
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Estou aqui com uns amigos
Que podem lhe aparecer
Um é a mula sem cabeça,
O outro Saci Pererê
Temos também o Caipora
Que está chegando agora
Não vai dar pra você ver.
Olhei para o ordenheiro
Que estava petrificado
Não dizia uma só palavra
Os olhos esbugalhados
Nem as pestanas batia
Olhava, mas nada via
Mas o chão todo molhado.
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Deu uma pausa na história
Então começamos a gritar
E o que a senhora fez?
- Eu procurei me sentar
Não adiantava correr
Nem ao menos se esconder
Sentei pra gente conversar.
Então velho Papa figo
Mandou o seguinte recado
Avise pra sua garotada
Que esse lugar é sagrado
Se tomarem banho no rio
Escondam bem o pavio
Senão vão ser é capados.
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Estão todos nos olhamos
Não dava pra entender
Somente o primo Gustavo
Queria assim proceder
Tinha sido ontem a noite
Alguém gritou; não se afoite
Que você pode até morrer.
Pensávamos que era mentira
O que falava a cozinheira
Ninguém poderia acreditar
Em toda aquela baboseira
Mas com o recado no final
Foi como um tiro letal
Gustavo sai na carreira.
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Cercamos a velha cozinheira
Com um milhão de perguntas
Como é que é o Caipora?
- Os seus pés nunca se juntam
Pois são totalmente tortos
Anda montado em um porco
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E a Mula sem cabeça,
Como é que ela faz?
- Sua cabeça é de fogo
É horrível por demais.
Já nosso Saci Pererê.
Corre muito mais que você
Só com uma perna, rapaz.
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Então a mana muito curiosa
Pergunta: pelo Curupira
Tem os cabelos vermelhos
Arrepiados e em tiras
Anda na mata só a noite
Quando o vento é de açoite
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E então naquela noite
Quase que ninguém dormiu
Com medo da assombração
Que e velha cozinheira viu
E com a mensagem mandada
A gente dava era risada
Só lembrando do paviu..
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Pela manhã bem cedinho
Procuramos vô Manoel
Levaram para um hospital
Nosso ultimo coronel
Todo mundo preocupado
Pois nosso ator tá cansado
Taçvez seu ultimo papel.
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Todos fomos visita-lo
Sem choro ou pressentimento
Sabíamos que pra o
centenário
Estava chegando o
momento
Fez-me um gesto com a
mão
Me indicando a direção
Mostrando-me um
monumento.
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Essa esfinge Japonesa
Guarde-a com muito
cuidado
Cuide dela bem
direitinho
Em um lugar bem
reservado
As chaves estão com
seus pais
Só são três meu bom
rapaz
E tudo vai ser revelado.
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Só abram essa esfinge
Um mês depois que eu
partir.
Na missa de trinta dias
Vou estar lá para
assistir
Eu estarei ao seu lado
Pois vai ser muito
engraçado
Na hora que ela se
abrir.
56
Dois dias após as
férias,
O nosso bisavô partiu
Deixando toda família
Em estado pueril
Sem sabermos o que
falar
Do Coronel mais popular
Que a gente um dia viu.
Missa de trigésimo dia
Estávamos todos presentes
Apenas a velha cozinheira
Ficara em casa doente
Então vindo fundo da igreja
Alguém na sacristia solfeja
Uma música bem diferente.
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Era a música que ouvimos
Naquele caramanchão.
A músiuca do grilo cantante
Acelerou meu coração
Lembramo-nos do amuleto
Que levei colado ao peito
Como pediu o biso ancião.
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Estão pegamos as chaves
A esfinge logo foi
aberta
Todos querendo saber
Tava parecendo festa
Surge um grilinho de
corda
Pintado na cor de rosa
Trilando feito uma
orquestra.
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Estava desvendado o
segredo,
De toda aquela armação.
Perpetrada por nosso
bisavô,
Que nos deixou se ação.
O velhinho nos enganou,
Com o brinquedo que
comprou,
Em uma loja no Japão.
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