quinta-feira, 28 de setembro de 2023

A PENA E O CAMAFEU

       

 

A PENA E O CAMAFEU

                                  Nivaldo Melo

1

  1. Uma noite, minha vó
  2. Reuniu toda moçada,
  3. Mandou que todos sentassem
  4. Nas cadeiras da calçada.
  5. Disse; vou contar uma estória,
  6. Que está na minha memória
  7. Desde a última madrugada.
  8. 2
  9. Quero que prestem atenção
  10. E guardem bem na memória
  11. O que eu vou lhes contar
  12. Narra uma trajetória
  13. De um garoto inteligente
  14. Desses que cativa a gente.
  15. Vou começar a história.
  16. 3
  17. No ano noventa e oito
  18. Num período muito escuro
  19. Não sei se foi no presente
  20. No passado ou no futuro
  21. Quando uma pena prateado
  22. Por um menino foi achada
  23. Em cima de um monturo.
  24. 4
  25. A criança só guardou
  26. Aquela pena bonita
  27. Colocou em seu bizaco
  28. Junto com sua marmita
  29. Continuou seu caminho
  30. Voltando para seu ninho
  31. Sua gruta favorita.
  32. 5
  33. Dias depois do achado
  34. Voltou ao mesmo caminho
  35. Naquele mesmo monturo
  36. Encontrou um pergaminho
  37. Nada tinha ali escrito
  38. Mas tinha algo esquisito.
  39. Tava cheio de pontinhos.
  40. 6
  41. Mesmo sem entender nada
  42. Coloco-o em seu bizaco
  43. Revestiu o pergaminho
  44. Em um pedaço de trapo
  45. Guardou com muito cuidado
  46. Para que não fosse rasgado
  47. Prendeu com esparadrapo.
  48. 7
  49. Dias e dias passaram
  50. Do fato quase irreal
  51. Encontrar dois objetos
  52. Não é um caso normal
  53. Os dois no mesmo lugar
  54. É coisa de se admirar
  55. Que causa espanto geral.
  56. 8
  57. E o menino traquino
  58. Esqueceu de seus achados
  59. Nem se lembrava do local
  60. Aonde foram encontrados
  61. Se alguém lhe perguntava
  62. Ele simplesmente falava
  63. Eles estão bem guardados.
  64. 9
  65. Alguns anos se passaram
  66. E aquele garoto cresceu
  67. Já não era mais menino
  68. Seu corpo desenvolveu
  69. Agora um jovem rapaz
  70. Bonito até por demais
  71. Quando um fato aconteceu.
  72. 10
  73. Durante o sono da noite
  74. Teve um sonho diferente
  75. Aparecia um garoto
  76. Maltrapilho em sua frente
  77. O garoto assim falou
  78. Volte aonde encontrou
  79. O que te dei de presente.
  80. 11
  81. Leve consigo os presentes
  82. Do jeito que eles estão
  83. Faça como estou mandando
  84. Por favor preste atenção
  85. Nunca separe os dois
  86. Não deixe para depois
  87. Serão nossa salvação.
  88. 12
  89. Durante mais três noites
  90. O sonho se repetiu
  91. Deixando aquele jovem
  92. Um tanto quanto febril
  93. Então ele assim resolveu
  94. Procurar o que não perdeu
  95. Após três dias partiu.
  96. 13
  97. Foi procurar o monturo
  98. Onde encontrou os achados
  99. Foi com toda a certeza
  100. Jamais seria encontrado
  101. Faziam mais de dez anos
  102. Afirmava sem engano
  103. Tudo lá está mudado.
  104. 14
  105. Ao chegar lá no local
  106. Tudo estava do mesmo jeito
  107. Nada ali tinha mudado
  108. Estava tudo perfeito
  109. Mas ali tinha uma mulher
  110. Que esperava-o de pé
  111. Ela espirava respeito
  112. 15
  113. O jovem a cumprimentou
  114. Ela respondeu com aceno
  115. Imediatamente lhe entregou
  116. Um vidro muito pequeno
  117. Ele não creu no que viu
  118. O vidro estava vazio
  119. Mas tinha escrito Veneno.
  120. 16
  121. Imediatamente ao fato
  122. Ela sumiu do lugar
  123. Aconteceu muito rápido
  124. Nem deu tempo perguntar
  125. Por que daquele veneno?
  126. Tentou num gesto estremo
  127. Do veneno se livrar
  128. 17
  129. Foi quando ouviu uma voz
  130. Sussurrando em seu ouvido
  131. Tenha calma meu rapaz
  132. Não fique tão aturdido
  133. Sente para descansar
  134. Vou lhe levar a um lugar
  135. Vás ser mesmo abduzido.
  136. 18
  137. E como um passe de mágica
  138. Em sua frente surgiu
  139. Uma objeto transparente
  140. Em formato de funil
  141. Puxou o jovem pra dentro
  142. E mais rápido que o vento
  143. Daquele local sumiu.
  144. 19
  145. De dentro do objeto
  146. Só via o céu e o mar
  147. Ele tentou ver a terra
  148. Não conseguiu vislumbrar
  149. Ficou meio acabrunhado
  150. Estava meio desolado
  151. Deu vontade de chorar.
  152. 20
  153. O objeto onde estava
  154. Clareava e escurecia
  155. Ele então deduziu
  156. Deve ser noite e dia
  157. Ele achou que viajava
  158. Mas não sabia onde estava
  159. Mas era bonito o que via
  160. 21
  161. Aquele funil voador
  162. Não tinha porta ou janela
  163. Pra onde ele olhava
  164. Via apenas uma tela
  165. Uma tela transparente
  166. Porém muito resistente
  167. Tudo via com cautela.
  168. 22
  169. Voltou então a ouvir
  170. Aquela voz no ouvido
  171. O som era tão baixinho
  172. Que parecia um zumbido
  173. Procurou ver de onde vinha
  174. Aquela voz tão fininha
  175. Deixava-o meio aturdido.
  176. 23
  177. Não procure de onde vem
  178. A voz está em você
  179. É um som bem penetrante
  180. Pra você nunca esquecer
  181. O que aqui vai ser dito
  182. Nada pode ser escrito
  183. Somente tu vás saber
  184. 24
  185. A pena e o pergaminho
  186. Que estão contigo guardados
  187. Ao voltares tem que manter
  188. Os dois sempre lado a lado
  189. Eles é que vão te guiar
  190. Aonde deves chegar
  191. Por isso te foram dados.
  192. 25
  193. Alguns momentos depois
  194. Aquele objeto parou
  195. Aquela vos no ouvido
  196. Assim pra ele falou
  197. Admire esse lugar
  198. É aqui que vás ficar
  199. Prestes atenção por favor.
  200. 26
  201. Era um lugar diferente
  202. Tudo ali era estranho
  203. Animais plantas e arvores
  204. Tinham o mesmo tamanho
  205. A água era reluzente
  206. De um sabor diferente
  207. E flores de cheiros estranhos.
  208. 27
  209. Tirou pena e pergaminho
  210. De dentro de seu bizaco
  211. Coloco-os sobre um tronco
  212. Naquele momento exato
  213. A pena então se mexeu
  214. Naquela hora cresceu
  215. E mudou o seu formato.
  216. 28
  217. Tomou forma de caneta
  218. E parou sobre o papiro
  219. Posou em cima de um ponto
  220. Em seguida deu um giro
  221. No momento apareceu
  222. Um pote com um camafeu
  223. Na imagem um vampiro.
  224. 29
  225. Naquele exato momento
  226. A voz falou pra o rapaz
  227. Deixe sempre o camafeu
  228. Com a frente virada pra traz
  229. Traz consigo o atrasado
  230. Deve sempre está virado
  231. E não esqueças jamais.
  232. 30
  233. Então naquele momento
  234. Ouve-se um som bem baixinho
  235. Era a pena trabalhando
  236. Em cima do pergaminho
  237. Rodando do mesmo jeito.
  238. Surge um escudo perfeito
  239. Todo cravado de espinhos.
  240. 31
  241. Agora já está completa
  242. Aqui a nossa missão
  243. Juntemos os objetos
  244. Façamos essa união
  245. Pena, veneno, papiro
  246. Camafeu e escudo no giro
  247. Tá faltando a decisão.
  248. 32
  249. E o que devo fazer?
  250. Pergunta então o rapaz
  251. Espera apenas um momento
  252. Que a resposta terás
  253. Permaneça ai sentado
  254. Se olhares ao seu lado
  255. Algo estranho verás.
  256. 33
  257. Então o jovem se vira
  258. E fica ali abismado
  259. Ali aparece um velho
  260. Ao seu lado bem sentado
  261. Com um olhar diferente
  262. Com o rosto sorridente
  263. E foi falando pausado.
  264. 34
  265. Neste lugar onde estamos
  266. É de um reino invisível
  267. Porque a mais de cem anos
  268. Aconteceu algo horrível
  269. No papel está escrito
  270. Um dia um jovem bonito
  271. Vai deixar tudo visível.
  272. 35
  273. Essa pena escreveu
  274. Tudo nesse pergaminho
  275. Cada fato acontecido
  276. Representa um pontinho
  277. É só você colocar
  278. A pena sobre o lugar
  279. Que saberás direitinho.
  280. 36
  281. O jovem põe logo a pena
  282. Sobre o ponto inicial
  283. Então ele ouve da voz
  284. “Estás chegando ao umbral
  285. Iniciamos a jornada
  286. Não haverá mais parada
  287. Só paramos no final”
  288. 37
  289. Segues então o caminho
  290. Que está a tua frente
  291. Durante a trajetória
  292. Verás algo diferente
  293. O mal está escondido
  294. Mas estás bem protegido
  295. Pelo escudo e o pingente.
  296. 38
  297. O rapaz olha para a pena
  298. E viu ela caminhando
  299. Por cima do pergaminho
  300. E toda história narrando
  301. De repente tudo escuro
  302. Ele está frente a um muro
  303. O seu caminho barrando.
  304. 39
  305. Coloca a mão no bizaco
  306. Sob a orientação da voz
  307. Retira o vidro vazio
  308. E num movimento veloz
  309. Joga o vidro contra o muro
  310. Se ouve um grito “ESCUNJURO
  311. ESTÁ CHEGANDO O ALGOZ”.
  312. 40
  313. O muro desaparece
  314. Naquele momento exato
  315. O jovem apanha o vidro
  316. Colocando-o no bizaco
  317. Então paga o camafeu
  318. Do lugar onde escondeu
  319. Com o vampiro no retrato.
  320. 41
  321. Coloca-o em seu pescoço
  322. Seu corpo colado atrás
  323. Sem olhar para a figura
  324. Parecida com o satanás
  325. Tudo que estava à frente
  326. Sumia bem de repente
  327. Fugindo do ferrabrás
  328. 42
  329. A voz sussurra baixinho
  330. Aqui devemos parar
  331. E quando chegar à noite
  332. É que voltamos andar
  333. Não tema pelo escuro
  334. Não haverá outro muro
  335. Que venha nos perturbar.
  336. 43
  337. Logo que chegou a noite
  338. Ao longe viu um clarão
  339. Iniciou a jornada
  340. Indo naquela direção
  341. Não demorou muito tempo
  342. Os seus olhos muito atentos
  343. Vislumbrou uma mansão.
  344. 44
  345. Na porta da construção
  346. Estava escrito assim
  347. “Essa é a minha casa,
  348. A casa da coisa ruim
  349. E se você quer viver
  350. Eu quero logo dizer
  351. Saia correndo daqui”.
  352. 45
  353. Ele empurra a porta
  354. Lá dentro, escuridão
  355. Apenas a parte de fora
  356. Tinha iluminação
  357. O jovem fica parado
  358. Sem saber para que lado
  359. Era sua direção.
  360. 46
  361. Então a voz sussurro
  362. Aperte no camafeu
  363. O jovem sem contestar
  364. A voz ele obedeceu
  365. Vampiro vê no escuro
  366. Com ele estarás seguro
  367. Foi quando luz acendeu.
  368. 47
  369. A luz apenas acendeu
  370. Pra iluminar o caminho
  371. Para que fosse percorrido
  372. Em passos muito mansinhos
  373. Fique atento meu rapaz
  374. Bem há frente encontrarás
  375. Bem forjado um ancinho.
  376. 48
  377. Quando o jovem pega o a peça
  378. Ali perto alguém gritou
  379. Por favor se identifique
  380. Você que aqui chegou
  381. Eu chego de outras terras
  382. Para acabar com a guerra
  383. Apareça meu senhor!
  384. 49
  385. Apareceu um pavão
  386. Mais alto que o rapaz
  387. Mostrando seu esplendor
  388. Demonstrando muita paz
  389. Vou ter que te proteger
  390. Assim devo proceder
  391. Pra matar o ferrabrás.
  392. 50
  393. Orientado pela voz
  394. O jovem pega o escudo
  395. E entrega para o pavão
  396. Recebe de volta um canudo
  397. Só abra quando acabar
  398. Depois de nós despachar
  399. De nossa terra o galhudo.
  400. 51
  401. O pavão logo se baixa
  402. Põe no seu dorso o rapaz
  403. E com um voo rasante
  404. Vai para a parte de traz
  405. Lá é um campo aberto
  406. Nossa floresta deserto
  407. Pra enfrentar ferrabrás
  408. 52
  409. De repente aparece
  410. A figura do galhudo
  411. Botando fogo e gritando
  412. Com um som muito agudo
  413. Saia de volta oh rapaz
  414. Sou filho do ferrabrás
  415. E vou acabar contudo.
  416. 53
  417. Neste momento o jovem
  418. Segura forte o ancinho
  419. E joga como uma flecha
  420. Em direção ao daninho
  421. Que pula para o lado
  422. E grita: tá engraçado
  423. Lutar contra um menininho.
  424. 54
  425. Então o nosso rapaz
  426. Pega o vidro de veneno
  427. E com um esforço voraz
  428. Em formato de aceno
  429. Joga sobre o opressor
  430. Que grita sentindo dor
  431. E cai ali no terreno.
  432. 55
  433. Pega então o camafeu
  434. Joga sobre o perdedor
  435. Então se ouve um estouro
  436. Tudo ali se iluminou
  437. O deserto vira floresta
  438. Ia começar a festa
  439. Quando a voz assim falou:
  440. 56
  441. Coloque logo a pena
  442. Na cabeça do pavão
  443. O rapaz obedeceu
  444. Então se ouve a explosão
  445. Tudo ali foi transformado
  446. Era um reino encantado
  447. Retornando a ser nação.
  448. 57
  449. O pavão era a Rainha
  450. Que era o astro principal
  451. O ancinho era o Rei
  452. Camafeu o General
  453. O vidrinho era Princesa
  454. Mostrando toda beleza
  455. Com seu vestido cristal.
  456. 58
  457. O jovem abre o canudo
  458. Recebido do pavão
  459. Nele continha a história
  460. Toda escrita à mão
  461. Sobre todo o acontecido
  462. Naquele reino esquecido
  463. Quando houve a maldição.
  464. 59
  465. O Rei quis presentear
  466. Cobrindo o rapaz com ouro
  467. O jovem então recusou
  468. Dizendo que o seu tesouro
  469. Era a coragem e o amor
  470. E também seu destemor
  471. Lutando como um touro.
  472. 60
  473. Porque eu fui convocado
  474. Pergunta ele a Rainha
  475. Ela com gesto fidalgo
  476. Disse tá escrito na linha
  477. Na linha do pensamento
  478. Foi escrito a muito tempo
  479. No tempo da carochinha.
  480. 61
  481. Pois daqui há muitos anos
  482. A história vai ser narrada
  483. Por uma senhora bonita
  484. Avó de uma rapaziada
  485. Contadora de histórias
  • Criadas por sua memória
  • Depois será transformada.
  1. 62
  2. Seu neto vai escreve-la
  3. Em formato de cordel
  4. E vai eternizar a história
  5. Deixando tudo no papel
  6. É Nivaldo de Oliveira
  7. Que afirmo sem asneira
  8. Que é um grande Menestrel.

  9.  

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